sábado, 27 de dezembro de 2008

Nenhum ser nos foi concedido. Correnteza apenas
Somos, fluindo de forma em forma docilmente:
Movidos pela sede do ser atravessamos
O dia, a noite, a gruta e a catedral.

Assim sem descanso as enchemos uma a uma
E nenhuma nos é o lar, a ventura, a tormenta,
Ora caminhamos sempre, ora somos sempre o visitante,
A nós não chama o campo, o arado, a nós não cresce o pão.

Não sabemos o que de nós quer Deus
Que, barro em suas mãos, conosco brinca,
Barro mudo e moldável que não ri nem chora,
Barro amassado que nunca coze.

Ser enfim como a pedra sólida! Durar uma vez!
Eternamente vivo é este o nosso anseio
Que medroso arrepio permanece apesar de eterno
E nunca será o repouso no caminho".



(Hermann Hesse - O Jogo das Contas de Vidro)


..................................................................................


Quero viver a simplicidade de só ser:
Ser dor, quando ferida,
Ser paz, quando silêncio,
Ser riso, quando agraciada.

Mas como ser simples sem ser só?
Sofro e não digo,
Grito em silêncio,
Gargalho ao avesso.

Como,
Como só ser sem ser só?





Construindo Carol

Adoraria atribuir a frase a alguém, em busca de algum crédito, mas o digo eu mesmo: aquele que tem para si janelas não se pode ter sozinho. Olha, a menina descendo a rua, a imensa rua, cara e coração dessa cidade. Subiu as escadas da Gazeta e espera. Agora, não mais sozinha.

Cara, poderia dizer o que diz, só acompanhando essas mãozinhas frenéticas. Nervosa, há de estar nervosa. Nervosa e sem bolsos. Loira. Vestido solto que combinaria melhor com um ambiente que não este. Conheço poucos além deste, sou de pouca ajuda. O moço usa menos palavras. Usa menos mãos.

Quem serão? Digo eu quem ela é: Uma mocinha infeliz, fumante de cigarros pretos, com hábitos notívagos e freqüentadora assídua dessas escadarias. Seus acompanhantes, individualmente menos assíduos. Variados. Seu nome? Carol é um belo nome, batizo-a Carol. Carol é bi, fumante, insone e inquieta. Carol é comunista ou consumista de moda que o é. Veste camisas.

Vê, menina? Te conheço e tu nem sabes que existo.

Série "Construindo Carol"

Carol era um desenho. Nanda, amiga minha, sua criadora. Nanda quis que Carol existisse a partir do maior número de mãos que se fizesse disposto. Atribuíram caracteríscas. Agora, muitas mãos escrevem Carol. Eu sou um par delas.

Aguardem.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Eu falto nessa terra
E sou só eu
Que sinto falta.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Há tristeza na palavra não dita.
Há tristeza na palavra que é pouco.
Há tristeza nesse peito que é todo,
Mas todo ausente.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Da menina

Seus olhos perdidos passeiam tardes inteiras.
Perdidos que são, horas a fio,
tecendo imagens.

Imaginando.

São mundos e mundos por dia.

Acorda 
e cai a noite:
tece-se as pernas
tece-se mãos
e a menina vai tecer o sustento
de suas tardes e teias.
Acordou-me a garganta arranhada.

Terá sido a aspereza das palavras que uso?
Terá sido a aspereza do ar que respiro?
Terá sido a aspereza?
A aspereza que é tua?

Engoli.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Vim duma terra banhada por águas quentes.
Vim quente duma terra
Ensolarada.

Alimentada da seiva,
Dormida da sombra,
Embasbacada de belezas,
Bela.


terça-feira, 21 de outubro de 2008

Armadilha

Saída do banho, seca ao sol.
Ao sol, molhada em suor.
Ao banho.
Molhada.
Toalha.
Toalha, ao chão.
-Eu me rendo, querido.
Silenciaram um silêncio nunca havido.
Soaram, só pelo som:
-Coisa qualquer.
-Coisa qualquer, em resposta.
Fingiram dormir, até que dormiram.
Penso em ti.
Amedronto: se penso, te crio.
Amedronto: se crio, posso já não conhecer.
Entristeço.

Era Noite

Eram belos os olhos que me visitaram, enquanto dormia.
Borboleteram em mim cenas belas.
Borboleteram comigo.
Abri os olhos.
Partiram.

Tentativa

-Você não mudou nada.
-Você me olha ainda da mesma maneira.
-...os mesmos cortes.
-Cicatrizes.
-As mesmas cores. Que nos falta?
-Contorno que nos amarre.

Sonho

Era o caminho de chão de areia de branca cor.

Era o vento que era todo em teu cabelo.

Era o florido das paredes que tomava-te a saia e coloria-te os olhos.

E era eu,

E era tu, que eras sonho.

Fez-se um mundo, que não ia além de teu umbigo, menina.

Fiz de ti o mundo.

Desfê-se o homem.

Desfê-se.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Pintem-me um céu no teto,
Que me cansa procurar estrela em céu nublado.

Pintem-me um céu no teto.
Pintem-me estrelas cadentes,
que em tempos de nuvem (...) os anseios são muitos.

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Agora, foi-se de vez.

Enquanto era todo raiva,
Era todo rubro,
Era meu ainda.

Agora,
Está como pedra ao meu toque.
Gelou-me os dedos.

Está como quem morre e me deixa pra morrer.

Pois bem:
Não sei se lhe deixo ou se me ato.
Cara: serei lembrança
Coroa: fardo